Fonte: Autora: Jane Nelsen - www.positivediscipline.com
Tradução e adaptação: Marília Barini
Crianças com menos de três anos não entendem o “não” da maneira que a maioria dos pais pensa que entendem. (E uma compreensão completa do “não” não ocorre magicamente quando a criança completa três anos. É um processo de desenvolvimento.) “Não” é um conceito abstrato que está em oposição direta à necessidade de desenvolvimento das crianças pequenas de explorar seu mundo e desenvolver seu senso de autonomia e iniciativa.
Ah, seu filho pode “saber” que você não quer que ele faça alguma coisa. A criança pode até saber que você vai ter uma reação de raiva se ela fizer isso, no entanto, ela não consegue entender o porquê, da maneira como um adulto pensa que ela pode. Por quê outro motivo uma criança olharia para você antes de fazer o que ela “sabe” que não deveria fazer, sorrir e fazer mesmo assim? Saber coisas quando criança significa algo muito diferente de saber coisas quando adulto. Sua versão de conhecimento carece dos controles internos necessários para deter seus dedos errantes.
Pesquisadores como Jean Piaget descobriram há muito tempo que as crianças pequenas não têm a capacidade de entender causa e efeito (uma excelente razão para não tentar dar sermões e convencer uma criança a fazer o que você quer – ou usar o castigo punitivo). Na verdade, o pensamento mais elaborado, de "ordem superior", como entender as consequências e a ética, pode não se desenvolver até que as crianças tenham dez anos.
A demonstração de Piaget a seguir ilustra o desenvolvimento intelectual e ajuda os pais a entender por que as crianças não conseguem entender alguns conceitos (como “não”) da forma que os adultos pensam que podem.
Demonstração de Piaget
Encontre dois copos do mesmo tamanho. Em seguida, encontre um copo mais alto e mais fino e um copo mais baixo e mais largo. Encha os dois copos do mesmo tamanho com água até que uma criança de três anos concorde que os dois copos têm a mesma quantidade de água. Então, bem na frente dela, despeje a água de um desses copos no copo baixo e largo e a do outro no copo alto e fino. Em seguida, pergunte a ela se a quantidade de água nos copos ainda é igual. Ela dirá “Não” e dirá qual copo ela acha que contém mais água. Uma criança de seis anos dirá que eles contêm a mesma quantidade e pode dizer o porquê.
Esta demonstração ilustra as habilidades de pensamento identificadas por Piaget. Quando entendemos que perceber, interpretar e compreender um evento são tão marcadamente diferentes para crianças pequenas, nossas expectativas como adultos se alteram. O significado que as crianças atribuem às suas experiências não corresponde ao significado que os adultos atribuem às mesmas experiências.
Erik Erikson, psiquiatra do desenvolvimento infantil, identificou as idades e os estágios do desenvolvimento socioemocional. Por volta de um ano de idade, as crianças entram no estágio "eu faço isso". É quando elas desenvolvem um senso de autonomia versus dúvida e vergonha. As idades de dois a seis anos anunciam o desenvolvimento de um senso de iniciativa versus culpa. É um trabalho de desenvolvimento da criança explorar e experimentar. Você pode imaginar como é confuso para uma criança ser punida pelo que ela está programada para fazer? Ela se depara com um dilema real (em um nível subconsciente): “Obedeço aos meus pais ou sigo meu impulso biológico para desenvolver autonomia e iniciativa explorando e experimentando meu mundo?”
Esses estágios de desenvolvimento não significam que as crianças devem
poder fazer o que quiserem.
Isso explica por que todos os métodos para obter cooperação devem ser gentis e firmes ao mesmo tempo, em vez de controladores e/ou punitivos. Este é um momento da vida em que a personalidade de seu filho está sendo formada e você quer que ele tome decisões sobre si mesmo que digam: “Sou capaz. Posso tentar, errar e aprender. Eu sou amado. Eu sou uma boa pessoa." Se você estiver tentado a ajudar seu filho a aprender por culpa, vergonha ou punição, estará ajudando a criar crenças desanimadoras (um sentimento de culpa e vergonha) que são difíceis de reverter na idade adulta.
As três ferramentas de disciplina mais importantes para usar com crianças menores de quatro anos são supervisão, distração e redirecionamento. Mostrando-lhes o que fazer em vez do que não fazer
(mostrando-lhes como fazer carinho em vez de dizer: “Não bata.”) Durante os primeiros anos de vida, seu trabalho é manter seu filho seguro sem deixar os seus medos desencorajá-lo. Por esse motivo, a supervisão é uma ferramenta importante para os pais, juntamente com a gentileza e a firmeza ao redirecionar ou ensinar seu filho.
Os pais quase sempre citam o perigo de uma criança correr para a rua como justificativa para bater em uma criança pequena. As razões incluem a natureza de vida e morte da situação, a necessidade de obediência imediata e a eficácia de uma surra para chamar a atenção de uma criança. A única coisa que eles esquecem é que, para uma criança, um pai bravo, gritando e batendo é provavelmente muito mais assustador do que qualquer rua.
Eu sempre pergunto a esses pais: “Depois de você ter espancado seu filho para ensiná-lo a ficar longe da rua, agora você vai permitir que ele brinque na frente de uma rua movimentada sem supervisão?”
A resposta é sempre: “Não”.
Eles sabem que, com ou sem palmadas, não podem esperar que a criança tenha maturidade e discernimento para ter essa responsabilidade.
Distrair e redirecionar funcionam bem com crianças pequenas.
Daniel, de quinze meses de idade, estava cambaleando em direção ao computador de seu pai. Papai chamou seu nome e Daniel olhou para ele, sorriu e cambaleou tão rápido na direção do computador que quase caiu. Papai o pegou, deu-lhe um grande abraço e o levou para seu quarto.
Quantas vezes?
E se Daniel continuar voltando ao computador proibido? Quantas vezes um pai deve distrair ou redirecionar a atenção de uma criança? Bem, quantas vezes for necessário. Como mencionamos antes, é preciso paciência e perseverança para treinar uma criança pequena. Se o pai de Daniel batesse na mão dele ou lhe desse uma surra, ele ainda iria querer brincar com o computador? Provavelmente sim. E mesmo que as palmadas interrompam o comportamento, qual é o custo em autoestima, dúvida e vergonha? Quais são as lições sobre a violência? Gentilmente, mas com firmeza, direcionar Daniel para objetos que ele possa mexer, e continuar a fazê-lo até que ele entenda a mensagem, orienta seu comportamento sem punir ou envergonhar e sem convidar a uma batalha de vontades.As crianças estão experimentando a individuação, aprendendo a se ver como seres separados e independentes. É um processo natural e saudável, mas muitas vezes difícil para os pais. Em certo nível, não demora muito para uma criança aprender o poder da palavra “não”, ou que, ao usá-la, pode provocar todo tipo de reações interessantes. Os adultos nem sempre podem evitar esses confrontos, mas mudar seu próprio comportamento e expectativas pode diminuir seu impacto.